Bancen Jud e Sisbajud: bloqueio diário e bloqueio consecutivo
- Hugo L Meirelles Monteiro
- 17 de abr. de 2020
- 6 min de leitura
Atualizado: 8 de jun. de 2021
1. Durante um processo judicial, o juiz pode determinar que os bancos bloqueiem valores existentes em conta bancária ou aplicação financeira do executado, conforme prevê o art. 854, caput, do CPC/2015, que diz:
“Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou em aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exequente, sem dar ciência prévia do ato ao executado, determinará às instituições financeiras, por meio de sistema eletrônico gerido pela autoridade supervisora do sistema financeiro nacional, que torne indisponíveis ativos financeiros existentes em nome do executado, limitando-se a indisponibilidade ao valor indicado na execução.”.
2. Para isso foi criado o sistema Bacen Jud, “que é um instrumento de comunicação eletrônica entre o Poder Judiciário e instituições financeiras bancárias, com intermediação, gestão técnica e serviço de suporte a cargo do Banco Central”[1].
3. Esse sistema permite que o juiz emita, transmita e acompanhe as seguintes ordens judiciais[2]:
a) Requisição de Informações;
b) Bloqueio de Valores;
c) Desbloqueio;
d) Transferência de Valores Bloqueados;
e) Reiteração (quando o banco não responda);
f) Cancelamento (quando o banco não responda).
4. De acordo com o art. 7°, caput, do Regulamento Bacen Jud 2.0, após as 19 horas, o Banco Central consolida as ordens de todo o país e as transmite às instituições financeiras até as 23 horas e 30 minutos. No mesmo dia as instituições recebem os arquivos contendo as ordens judiciais para cumprimento.
5. No que se refere ao bloqueio de valores, até o Regulamento do Bacen Jud de 17 de outubro de 2016 (entrada em vigor), as instituições financeiras deveriam apenas verificar e bloquear os valores (sempre dentro do limite ordenado pelo juiz) que encontrassem no início do dia útil seguinte ao recebimento da ordem. O que fosse encontrado naquele momento seria bloqueado, em uma situação que se pode designar de bloqueio único, pois não deveria proceder a uma nova tentativa, mesmo que não tivesse encontrado valor suficiente.
6. A regra estava no art. 13, § 2°, e dizia o seguinte: “Cumprida a ordem judicial na forma do § 1º e não atingido o limite da ordem de bloqueio inicial, caso necessário complementar o valor, o magistrado deverá expedir nova ordem de bloqueio.”.
7. No § 1° desse artigo tinha o seguinte:
“Essas ordens judiciais atingem o saldo credor inicial, livre e disponível, apurado no dia útil seguinte ao que o arquivo de remessa for disponibilizado às instituições responsáveis, sem considerar créditos posteriores ao cumprimento da ordem, cotas partes dos cooperados de cooperativas de crédito e, nos depósitos à vista, quaisquer limites de crédito (cheque especial, crédito rotativo, conta garantida etc.).”.
8. Posteriormente, o Regulamento do Bacen Jud de 07 de junho de 2018 veio estabelecer que as instituições financeiras deveriam verificar e bloquear os valores (sempre dentro do limite ordenado pelo juiz) que encontrassem desde o início do dia útil seguinte à ordem judicial até o horário limite para emissão de uma Transferência Eletrônica Disponível – TED neste mesmo dia. De modo que, se não fosse encontrado valor suficiente na primeira tentativa, a instituição financeira deveria continuar verificando e bloqueando novos valores que aparecessem até às 17h, em uma situação que se pode designar de bloqueio diário intermitente, pois deveria proceder novas tentativas naquele dia quando não tivesse encontrado valor suficiente.
9. A regra estava no art. 13, § 4°, e dizia o seguinte:
“Cumprida a ordem judicial na forma do § 2º e não atingido o limite da ordem de bloqueio inicial, caso necessário complementar o valor, a instituição participante deverá efetuar pesquisa, para alcançar o valor determinado, até o horário limite para emissão de uma Transferência Eletrônica Disponível – TED do dia útil seguinte à ordem judicial.”.
10. No § 2° desse artigo tinha o seguinte:
“Essas ordens judiciais atingem o saldo credor inicial, livre e disponível, apurado no dia útil seguinte ao que o arquivo de remessa for disponibilizado às instituições responsáveis, sem considerar cotas partes dos cooperados de cooperativas de crédito e, nos depósitos à vista, quaisquer limites de crédito (cheque especial, crédito rotativo, conta garantida etc.), e ainda, ativos comprometidos em composição de garantias, conforme a legislação de regência de cada matéria.”.
11. O Regulamento do Bacen Jud de 12 de dezembro de 2018 também previu que as tentativas de bloqueio devem se estender durante todo o dia, se necessário, mas veio acrescentar que não pode ser retirado dinheiro das contas e aplicações durante o cumprimento da ordem judicial pelo banco, de modo a impedir que, na situação em que não é encontrado valor suficiente na primeira tentativa de bloqueio, entre cada tentativa de bloqueio do banco o executado recebesse algum novo valor e o levantasse, impedindo o bloqueio desta parte.
12. Portanto, segundo esta regra, se não é encontrado valor suficiente na primeira tentativa, a instituição financeira deve continuar verificando e bloqueando novos valores que aparecerem até às 17h, mas, agora, impedindo o executado de levantar qualquer valor nesse período, em uma situação que se pode designar de bloqueio diário constante, pois todo o dinheiro que surgir na conta ou aplicação fica, desde logo, impossibilitado de ser levantado pelo executado (ou por terceiros, salvo se destinado a amortizações de saldo devedor de limites de crédito).
13. A regra estava no art. 13, § 4°, e dizia o seguinte:
“Cumprida a ordem judicial na forma do § 2º e não atingida a integralidade da penhora nela pretendida, sendo assim necessária complementação (cumprimento parcial), a instituição financeira participante deverá manter pesquisa de ativos do devedor durante todo o dia, até o horário limite para emissão de uma Transferência Eletrônica Disponível – TED do dia útil seguinte à ordem judicial ou até a satisfação integral do bloqueio, o que ocorrer primeiro. Neste período, permanecerão vedadas operações a débito (bloqueio intra day), porém permitidas amortizações de saldo devedor de quaisquer limites de crédito (cheque especial, crédito rotativo, conta garantida etc).”.
O § 2° deste artigo manteve a mesma redação anterior.
14. Diferente do que foi abordado é a ordem de bloqueio consecutivo (ou permanente), na qual o juiz emite decisão para que o banco proceda tentativas consecutivas de bloqueio em dias diversos, no período e frequência da ordem. Esta ordem não podia ser transmitida por meio do Bacen Jud, sendo, neste caso, necessária a expedição de ofício físico ou eletrônico ao Banco Central.
15. Neste sentido foi o Comunicado n° 1788/2017 da Corregedoria Geral do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, onde consta[3]:
“Os expedientes referentes a ordens judiciais destinadas a Instituições Financeiras que não estejam relacionados no Regulamento BACEN JUD 2.0, tais como as relativas a bloqueio total de ativos (como os relativos a indisponibilidade total de recursos), e o bloqueio permanente (ordens consecutivas emitidas até o atingimento de valor determinado) deverão ser encaminhados por meio de expediente em papel àquela Autarquia, no seguinte endereço, ou por e-mail, utilizando a certificação digital”.
16. Em 08/09/2020 o Bacen Jud foi sucedido pelo SISBAJUD - Sistema de Busca de Ativos do Poder Judiciário, operado pelo CNJ - Conselho Nacional de Justiça. Para além de manter as funcionalidades já existentes no Bacen Jud, o que inclui o bloqueio diário constante, o novo sistema permite novas funções, como, por exemplo, "requisitar informações detalhadas sobre extratos em conta corrente no formato esperado pelo sistema SIMBA do Ministério Público Federal, [...] emitir ordens solicitando das instituições financeiras informações dos devedores tais como: cópia dos contratos de abertura de conta corrente e de conta de investimento, fatura do cartão de crédito, contratos de câmbio, cópias de cheques, além de extratos do PIS e do FGTS"[4].
17. E, principalmente, "em breve será liberada no SISBAJUD a reiteração automática de ordens de bloqueio (conhecida como 'teimosinha') [ou bloqueio consecutivo], e a partir da emissão da ordem de penhora on-line de valores, o magistrado poderá registrar a quantidade de vezes que a mesma ordem terá que ser reiterada no SISBAJUD até o bloqueio do valor necessário para o seu total cumprimento. Esse novo procedimento eliminará a emissão sucessiva de novas ordens da penhora eletrônica relativa a uma mesma decisão, como é feito atualmente no Bacenjud"[4].
Autor: Hugo Leite Meirelles Monteiro (Advogado e Mestre em Direito Tributário)
Publicação: 17 de abril de 2020.
Atualização: 01 de outubro de 2020.
[1] Conferir o Manual básico do Bacen Jud 2.0. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2011/02/manual-basico-do-bacen-jud-2.0.pdf>. Acesso em: 17 de abril de 2020.
[2] Conferir o Regulamento Bacen Jud 2.0. Disponível em <https://www.cnj.jus.br/sistemas/bacenjud/documentos-bacenjud/>. Acesso em: 17 de abril de 2020.
[3] Disponível em: <http://www.tjsp.jus.br/Corregedoria/Comunicados/Comunicado?codigoComunicado=11557>. Acesso em: 17 de abril de 2020.
[4] Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/sistemas/sisbajud/>. Acesso em: 01 de outubro de 2020.